P

O livro começa pela apresentação da doutrina filosófica do autor, a que denomina de utilitarismo. O nome provém da idéia de que a moral teria sido estabelecida a partir da verificação, pela experiência e repetição, da utilidade (isto é, eficácia com relação ao fim visado) das ações. Esse princípio foi estabelecido por David Hume (1711-1776) no curso das discussões que tiveram lugar a propósito do tema (origem e fundamento da moral), no século XVIII, na Inglaterra. Bentham deu-lhe um novo direcionamento ao enfatizar que o reconhecimento daquela origem (a utilidade das ações) permitia tornar a moral uma ciência exata, introduzindo a medida.

Para Bentham, “a natureza colocou o gênero humano sob o domínio de dois soberanos: a dor e o prazer. Somente a eles compete determinar o que devemos fazer, bem como determinar o que na realidade faremos. Ao trono desses dois senhores está vinculada, por uma parte, a norma do que é reto e do que é errado, e, por outra, a cadeia das causas e dos efeitos”. A utilidade das ações mede-se pelo grau de felicidade que proporcionam a quem as pratica. Devido a esse fato, o interesse identifica-se com a utilidade.

O passo seguinte consistirá em dizer que a comunidade é uma entidade fictícia. De sorte que seus interesses correspondem apenas à soma dos interesses dos diversos membros que a integram.

Alguns comportamentos podem comprometer a efetivação de uma ação segundo o princípio da utilidade, isto é, com o propósito de obter prazer. O primeiro corresponde ao ascetismo, que pode provocar uma inversão do princípio (cita o exemplo dos monges que praticam a auto-flagelação). O segundo seriam a simpatia e antipatia que podem levar as pessoas a aprovar uma ação a partir da simples adesão a quem a pratica, ou o inverso. Tal se dá em especial no terreno político. As circunstâncias consideradas em nada enfraquecem o princípio da utilidade porquanto se referem a comportamentos particulares e sequer podem deixar de ser a ele referidos.

São quatro as fontes da dor e do prazer: física, política, moral e religiosa. Cada uma delas pode emprestar a qualquer lei ou regra de conduta uma força obrigatória. Assim, todas podem ser denominadas de sanções.

A sanção física refere-se à vida presente e ao curso ordinário da natureza - não propositadamente modificados pela interposição de algum ser humano nem por interposição extraordinária de algum ser invisível superior. Se o prazer ou a dor provêm de alguma autoridade governamental, revestida de direitos equiparáveis aos do juiz, trata-se de sanção política. A sanção moral (também a denomina de popular) refere-se ao prazer e à dor oriundas de pessoas de destaques na comunidade, segundo a disposição espontânea das pessoas e não de acordo com imposições legais. Finalmente, a sanção religiosa, como diz, depende da “mão imediata de um ser superior invisível”. Algumas das mencionadas sanções afetam ao homem não fisicamente mas do ponto de vista psíquico, razão pela qual Bentham examina o papel e funções da consciência.

Na suposição de que sua doutrina deveria servir de base ao direito penal, Bentham detêm-se no exame da motivação das ações, da questão da intencionalidade, etc., a fim de determinar as punições. Nesse particular, trata especificamente dos casos em que não cabe punir bem como da proporcionalidade entre as punições e os crimes.

A obra considera com a máxima amplitude o que denomina de “método para medir uma soma de prazer ou de dor”. A premissa geral é a de que a aferição deve estar referida a uma pessoa determinada e diz respeito ao valor que atribui ao prazer e à dor. Essa avaliação compreende intensidade, duração, certeza ou incerteza e proximidade no tempo. É verdadeiramente imenso o elenco de variações que considera, o que de certa forma inviabiliza a sua efetivação. Mesmo com os recursos disponíveis em nosso tempo, as pesquisas de opinião - que estariam próximas do que tem em vista - obedecem ao princípio do máximo de objetividade e de delimitação precisa de poucas variáveis. Em que pese essa evidência, a idéia de que o comportamento social pode ser medido e previsto, sendo afirmada por uma doutrina de tanto prestígio na América e na Inglaterra, como o utilitarismo, deve ser considerada como determinante da persistência com que tal objetivo foi perseguido, terminado por ser bem sucedido, notadamente em matéria eleitoral e, em muitas circunstâncias, para orientar as ações governos, adequando-as às aspirações das comunidades. (Ver também BENTHAM, Jeremy).