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Na ordem da exposição, a Física deveria preceder à Metafísica. De modo que a coincidência de alguns temas (como a questão das causas, abordada nos Livros I e II desta última obra e a do Primeiro Motor, contida no Livro VIII) não deve ser considerada como repetição, tratando-se, ao contrário, do ponto de partida da consideração do tema, isto é, a sua abordagem inicial. O tipo de saber contido na Física – do mesmo modo que em outras obras de Aristóteles, a exemplo Do céu – corresponde ao que foi denominado de Filosofia Natural, isto é, uma inquirição de caráter especulativo acerca da natureza. Essa denominação era muito popular ainda no século XVIII, quando o novo tipo de saber acerca da natureza (a física moderna) ainda não se havia consolidado. O livro básico de Newton, aparecido em 1687, chamou-se de Princípios matemáticos da Filosofia Natural. Na reforma pombalina de 1772, introduzida justamente para fazer circular em Portugal a nova física, a Universidade foi reestruturada em torno do estabelecimento que se denominou de Faculdade de Filosofia Natural.

A Filosofia Natural procede a uma análise conceitual. Nela a experiência não tem papel decisivo, embora não se possa dizer de Aristóteles que desdenhasse a observação. Neste sentido, difere fundamentalmente da física newtoniana, cuja base é a medida. A física de Aristóteles é de caráter qualitativo. As substâncias distinguem-se umas das outras por suas qualidades.

O Livro I insere uma grande digressão acerca dos primeiros princípios da natureza, preocupando-se com o seu número e discutindo as teorias precedentes. Basicamente trata das causas material e formal. Ao leitor moderno parecerá estranho alguns de seus exemplos, retirados da vida em sociedade. Cabe ter presente, contudo, que Aristóteles parte de uma classificação geral dos seres cujo cerne é a pressuposição da existência de espécies fixas e imutáveis, vale dizer, na física aristotélica não ocorre a idéia de evolução. Os três ramos fundamentais da Física são 1º) as coisas incapazes de movimento; 2º) as coisas em movimento mas indestrutíveis e, 3º) as coisas destrutíveis. De sorte que a hierarquização dos seres partindo dos inorgânicos para as substâncias complexas e os fenômenos psicológicos, que é básica no seu pensamento, não chega a ser referida.

O Livro II prossegue na digressão de caráter geral, procurando elucidar o sentido da expressão “por sua natureza”. Além das causas, avança aqui a distinção entre mudança (ou transformação) e movimento. Há quatro espécies de mudanças, dizendo todas respeito à geração e destruição da substância. O movimento não interfere na natureza da substância. O Livro II trata ainda das condições da mudança (transformação). Discute também a noção de finalidade na natureza.

O cerne da Física corresponde aos Livros III a VII, onde discute a questão do movimento e das noções a este vinculadas, a saber: o infinito; o lugar; o vazio e o tempo. Aristóteles precisa que não há seres sensíveis infinitos. A noção de infinito aplica-se ao tempo e ao movimento. A noção de lugar está relacionada à de espaço, cuja dificuldade de entendimento advém da tendência natural à recusa em conceituá-lo como ente de razão, isto é, que não existe objetivamente. Aristóteles levanta esta dificuldade ao abordar questões como esta: podem dois corpos ocupar o mesmo lugar?  Daí a discussão em torno do vazio. Para Aristóteles a natureza não pode admiti-lo. Em relação ao tempo, Aristóteles esclarece as noções a este relacionadas, como agora, antes, depois, etc.

A classificação das mudanças (transformações) e dos movimentos é apontada nos Livros V e VI.
No Livro VII aparece a tese geral de que aquilo que é movido é movido por algo. É a preparação do tema do Primeiro Motor, que move sem ser movido, suscitada no Livro VIII, ao qual voltará na Metafísica. (Ver tambémARISTÓTELES).