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Dicionário das Obras
Básicas da
Cultura Ocidental
Antonio Paim
Índice: a - b - c - d - e - f - g - h - i - j - k - l - m - n - o - p - q - r - s - t - u - v - x - w - z
(A) Política
como vocação, de
Max Weber
Pouco antes de falecer, em 1919,
Max Weber pronunciou uma conferência
sobre a atividade política,
que seria publicada com o título
de A política como
vocação. O
texto passou à história
como um documento importante
acerca do papel do partido político
e do processo de sua constituição.
Ao fazê-lo, Weber estabelece
a distinção fundamental
entre essas agremiações
antes e depois do processo de
democratização
do sufrágio. Assim, no
século XIX, eram simples
blocos parlamentares, isto é,
formavam-se no Parlamento em
torno de notáveis, carecendo
de importância os eleitores.
Escreve: “Na época
não existiam partidos
organizados regionalmente, que
encontrassem base em agrupamentos
permanentes no interior do país.
Não existia outra coesão
política senão
a criada pelos parlamentares,
apesar de que as pessoas de importância
local desempenhavam papel marcante
na escolha dos candidatos”.
Para compreender os partidos
políticos de seu tempo – época
da Primeira Guerra Mundial – era
imprescindível constatar
que resultavam da fusão
entre os antigos blocos parlamentares
e os comitês locais formados
por imposição do
sufrágio universal e da
ampliação do universo
de eleitores. E embora tais agremiações
tenham desde então continuado
a desenvolver-se, tornando-se
estruturas muito organizadas,
dispondo de amplas assessorias,
núcleos programáticos
que os distinguem uns dos outros,
publicações e variados
instrumentos de formação
de quadros, Weber deu uma indicação
muito precisa sobre a característica
distintiva do sistema representativo
amadurecido, na forma como se
consolidou nas principais nações
do Ocidente. Na formulação
de Weber, trata-se de democracia
plebiscitária. Vale dizer,
periodicamente, o partido que
se encontra no poder é obrigado
a submeter-se ao referendo popular.
No mesmo texto, Weber avança
na formulação do
que passa então a denominar
de ética de responsabilidade,
distinguindo-a da “ética
de convicção”,
ou “ética dos fins
absolutos”, segundo a qual
os fins justificam os meios,
consigna que viria a ser encampada
pelos marxistas. A ética
de responsabilidade pretende
fazer renascer a tradição
kantiana, no que diz respeito à eliminação
da dependência da moral à religião,
reelaborando-a para abandonar
os vínculos que porventura
tivesse estabelecido com a suposição
de uma sociedade racional.
Os princípios da ética
de responsabilidade poderiam
ser enunciados como segue: 1º)
A vida humana comporta muitas
esferas que escapam à moralidade
em seu sentido próprio,
nada resultando em favor da moral
o empenho de estender o seu campo
de ação, havendo
concomitantemente esferas em
que se dá um conflito
claro entre a moral e os outros
valores. Existe notoriamente
uma tensão entre moral
e política e também
com as religiões que obrigam
seus seguidores a menosprezar
valores consagrados socialmente.
Estão neste caso os sectários
que se recusam ao serviço
militar, em revide ao que a sociedade
lhes cassa os direitos políticos.
2º) É necessário
uma atitude compreensiva e tolerante
em relação aos
valores morais últimos
em que o outro faça repousar
suas convicções.
Salvo a ética totalitária – que
no fundo acaba por se transformar
numa proposta cínica porquanto
em nome dos fins que alardeia,
sentem-se os seus partidários
a cavalheiro para comportar-se
de modo idêntico àqueles
que condenam, de que é exemplo
expressivo a condenação
da ditadura de Batista, admitindo-se
até a sua derrubada violenta,
para acabar melancolicamente
justificando a ditadura de Fidel
Castro –, salvo esse tipo
de comportamento, que a rigor
nada tem a ver com a moralidade,
sendo de todo incompatível
com a ética de responsabilidade,
nos demais eventos parte do pressuposto
de que as avaliações últimas
do indivíduo nunca podem
ser refutadas. É o que
Weber denomina de conflito insolúvel
das avaliações.
O razoável é aceitá-las
e compreendê-las, se queremos
ter direito a idêntica
prerrogativa.
3º) Não devemos nos
valer de circunstâncias
que nos colocam numa posição
de superioridade para impor nossas
convicções. Weber
toma aqui o exemplo da cátedra,
referido no Ensaio sobre
neutralidade axiológica.
4º) Devemos responder pelas
conseqüências previsíveis
de nossos atos. A esse propósito
escreve Weber: “Quando
as conseqüências de
um ato praticado por pura convicção
se revelam desagradáveis,
o partidário de tal ética
não atribuirá responsabilidade
ao agente, mas ao mundo, à tolice
dos homens ou à vontade
de Deus, que assim criou o homem.
O partidário da ética
de responsabilidade, ao contrário,
contará com as fraquezas
comuns do homem (pois como dizia
muito procedentemente Fichte,(1) não
temos o direito de pressupor
a bondade e a perfeição
do homem) e entenderá que
não pode lançar
a ombros alheios as conseqüências
previsíveis de sua própria
ação. Dirá,
portanto: “Essas conseqüências
são imputáveis à minha
própria ação”.
5º) Finalmente, a ética
de responsabilidade afirma que
os meios devem ser adequados
aos fins; que não há fins
altruísticos que justifiquem
o recurso a meios que não
possam ser compatíveis
com aqueles objetivos. Assim,
não se pode, em nome da
exaltação da pessoa
humana, a exemplo do que ocorreu
nos países vítimas
do totalitarismo, submetê-la
a procedimentos que a aviltam.
Os meios aviltantes é que
definem o cerne da ética
totalitária, ou melhor,
sob todas as circunstâncias
são os meios que definem
os fins. (Ver também WEBER,
Max).
(1) Johann
Glottlieb Fichte (1762-1814)
deu início à elaboração
do sistema filosófico
que deveria seguir-se à crítica
kantiana. Tendo saído
sem o nome do autor, sua
primeira versão do
sistema (elaboraria outras,
igualmente sem sucesso),
aparecida sem o seu nome,
foi atribuída ao próprio
Kant, que ainda vivia.
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