Dicionário das Obras Básicas da
Cultura Ocidental

Antonio Paim

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NEWTON, Isaac

Isaac Newton nasceu no interior da Inglaterra em 1642, numa família de agricultores que muito relutou em permitir que seguisse carreira universitária, ao invés da tradição familiar. Contudo, acabou matriculado no Trinity College, em Cambridge, em 1661, aos 19 anos. Sendo pobre, sustentava-se realizando trabalhos domésticos para os colegas. Deveria obter o grau de mestre em 1665 mas nesse ano a Universidade não funcionou devido à peste bubônica que afetou a Inglaterra. Tal se deu, entretanto, em 1668. No ano seguinte, o titular do curso de matemática, Isaac Barrow, renunciou à cadeira em seu favor. Barrow apreciava a vocação matemática do discípulo. Assim, tornou-se professor em Cambridge aos 26 anos de idade.

Tenha-se presente que a condenação de Galileu suscitou um grande movimento em prol da liberdade do conhecimento científico, de que resultou seu florescimento nos países protestantes. A esse propósito o renomado historiador da ciência Joseph Ben-David (1920-1896)(1) indica que eruditos protestantes, em Paris, Estrasburgo, Heidelberg e Tubing, assumiram a responsabilidade de difundir suas idéias, embora no ciclo imediatamente anterior na própria Universidade de Tubing, o Conselho Universitário, majoritariamente protestante, opusera restrições à doutrina copernicana. De todos os modos, o empenho em não aparecer aliados a Roma permitiu que se criasse um clima diferente nos países que haviam aderido à Reforma. Esse clima é descrito da forma seguinte pelo historiador inglês da ciência, L. W. Hull, autor de History and Philosophy of Science (2ª ed., 1959, tradução espanhola, Barcelona, Ariel, 1961): “Na Inglaterra, como na Holanda, os homens podiam professar livremente quaisquer opiniões científicas. Durante a época isabelina(2) e o século XVII não houve na Inglaterra perseguição aos cientistas ou não chegou a assumir qualquer significação. O sistema copernicano era professado por várias figuras célebres do período isabelino, o mais destacado dos quais era William Gilbert, fundador da teoria do magnetismo. As idéias de Copérnico, Kepler, Galileu ganhavam terreno sem cessar. Na última metade do século XVII, acabaram por achar-se solidamente estabelecidas nos círculos da Royal Society, em personalidades como Walls, Wron, Hooke, Newton e Halley. Graças a esses homens a teoria da gravitação universal adquiriu feição definitiva, o que corresponde, provavelmente, à mais importante conquista da revolução científica”. A fundação da Royal Society ocorreu em 1660.

Isaac Newton foi estimulado a por no papel as idéias que vinha desenvolvendo por seus companheiros daquele início da Royal Society, sobretudo Edmond Halley (1656-1742), astrônomo e matemático que muito contribuiu para a generalização do novo método científico, mas cuja fama provém do fato de ter aplicado a tese newtoniana da atração universal aos cometas observados em 1531 e 1607, considerando ser plausível admitir-se haver alguma relação com o de 1682. Em caráter pioneiro afirmou que se tratava de um mesmo corpo, prevendo seu regresso para 1758, hipótese que, ao ser confirmada, levou a que o cometa passasse a ser conhecido com o seu nome. Como a Royal Society não dispunha de recursos, Halley pagou do próprio bolso a edição da obra fundamental de Newton, aparecida em 1687, em latim, com o título de Philosophiae naturalis principia mathematica (“Princípios matemáticos da filosofia da natureza”. Geralmente citado como Principia). Naquela época não havia maior separação entre o novo método científico e a nova física, supondo-se que se tratava de uma teoria sobre a natureza como um todo e não de fenômenos limitados, o que explica a denominação de “filosofia natural” que perdurou durante certo tempo. A verdade entretanto é que a química só empreendeu aquele caminho quase um século depois e, a biologia, muito mais tarde. No século XIX, com a teoria da relatividade, estabelece-se que não se aplica ao núcleo atômico nem aos corpos distanciados da atmosfera terrestre.

Na visão dos autores da História da Ciência, da Universidade de Cambridge, os Principia vieram a ser considerados como o mais importante livro científico de todos os tempos. Segundo aqueles autores, Newton reescreveu toda a ciência do movimento dos corpos, existente em seu tempo, com enorme precisão matemática. Corrigiu também o equívoco de considerar ao magnetismo como a força de atração exercida pelo Sol, provando que se tratava da gravitação. Afirmou ainda que a lei da gravidade atuava no espaço tanto da Terra em relação à Lua como em relação a todos os outros corpos na superfície da Terra. A teoria da relatividade, de Einstein, não revogou a física newtoniana, correspondendo basicamente a uma sofisticação do estudo do movimento, ao considerar os corpos quando não se acham em repouso.

A par disto, Newton tornou clara a diferença essencial entre a pergunta aristotélica (qualitativa) e a da física moderna (quantitativa). Enquanto na física grega cogita-se da causa do movimento, a partir de Newton trata-se da causa da mudança de movimento, justamente o que permitiu a introdução – e a subseqüente generalização – da medida.

Disputando com a física cartesiana e com a física leibniziana, a física newtoninana tardou a ser reconhecida na França e na Alemanha. Mas, em 1738, com a publicação do livro Elementos da filosofia de Isaac Newton, de Voltaire, as suas teses tornam-se acessíveis em francês. Quando Kant publica A crítica da razão pura (1781) já se refere a nova física como sendo equivalente à elaboração de Newton, o que significava reconhecer que a proposta de Leibniz estava ultrapassada.

Newton interessou-se também pela óptica e dedicou ao assunto um de seus livros. A disciplina relaciona-se ao estudo da radiação eletromagnética, que se tornou uma espécie de ante-sala da investigação das formas de obtenção da eletricidade. Contudo, nesse particular, os desfechos mais importantes somente virão a ocorrer a partir da segunda metade do século XVIII, agora impulsionados pela Revolução Industrial. Com vistas àqueles estudos, Newton atuou no sentido de aperfeiçoar o microscópio.

Em 1701 foi eleito para a Câmara dos Deputados, tornando-se presidente da Royal Society em 1703. Interessou-se também por questões teológicas, tendo publicado uma interpretação da Bíblia com o título de As profecias de Daniel e o Apocalipse, que mereceu tradução brasileira.

Faleceu em 1727, aos 85 anos de idade. (Ver também GALILEU e As profecias de Daniel e o Apocalipse).


(1) Trata do assunto no livro O papel do cientista na sociedade, tradução brasileira divulgada pela Editora Pioneira (São Paulo, 1974).

(2) Elisabeth I reinou de 1558 a 1603.

 

 

 

 

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