include '../include/menu.php'?>
|
|
Dicionário das Obras
Básicas da
Cultura Ocidental
Antonio Paim
Índice: a - b - c - d - e - f - g - h - i - j - k - l - m - n - o - p - q - r - s - t - u - v - x - w - z
LUTERO
O iniciador da Reforma Protestante
chamava-se Martim Lutero (1483-1546).
Nasceu e viveu numa região
que formava um dos principados
que compunham a Confederação
Alemã, então
incluída no que se chamava
genericamente de Alemanha Central,
que no último pós-guerra
integrou-se à Alemanha
Oriental. Estudou no mosteiro
agostiniano de Erfurt, ordenando-se
sacerdote em 1507, aos 24 anos.
Mais tarde, tornou-se professor
de teologia na Universidade
de Wittenberg.(1)
Em 1517, aos 34 anos, Lutero
elaborou um documento que passou à história
com a denominação
de “95 teses sobre indulgências”.
O incidente prende-se ao seguinte:
o arcebispado de Magdeburgo,
ao qual estava subordinado, era
exercido por um jovem príncipe
de 27 anos, Albrecht von Hohenzollern.
Como era de praxe na época,
ao assumir aquela função
devia pagar ao Vaticano uma soma
considerada elevada (trinta mil
florins). Albrecht levantou esse
dinheiro junto à casa
bancária Fugger, tendo
sido autorizado pelo Vaticano
a promover uma coleta de dinheiro
entre os fiéis que fosse
suficiente: a) para repor o empréstimo;
b) para facultar quantia equivalente,
a ser encaminhada a Roma, destinando-se à edificação
da Catedral de São Pedro;
e c) atender às despesas
da própria coleta. Esta
ficou a cargo de um dominicano
chamado Johan Tetzel, com cerca
de 52 anos, que dispunha de uma
carruagem, três acompanhantes
e um criado. O prazo para levantamento
do dinheiro foi fixado em oito
anos. O Arcebispo Albrecht foi
nomeado Comissário das
Indulgências para toda
a Alemanha Central.
Lutero não nega que o
direito canônico faculte
o perdão das punições
que a própria Igreja haja
imposto a seus fiéis mediante
doações em bens.
A seu ver, entretanto, como as
indulgências estavam sendo
apregoadas e oferecidas levava
as pessoas a supor que, por aquele
meio, asseguravam a salvação
eterna. Escreve: “Por esta
razão, não pude
permanecer em silêncio.
Jamais pode alguém garantir
ao homem a salvação
pela função episcopal,
nem mesmo pela inspirada graça
de Deus; mas o apóstolo
manda (Fil. 2:12) que nos esforcemos
continuamente, com temor, pela
nossa salvação.
Nem sequer o justo será salvo
(I Pedro, 4:18). Afinal, é tão
estreito o caminho que conduz à vida,
que o Senhor chama aqueles que
devem ser salvos, pela voz dos
profetas Amós e Zacarias,
tirando-os do fogo à força.
E o Senhor anuncia sempre, novamente,
como é difícil
ao homem alcançar a salvação.
Como, então, querem eles
iludir o povo com fábulas
e promessas de indulgência,
embalando o povo com esperança
e segurança quando a indulgência
não ajuda as almas, de
modo algum, a obterem a bem-aventurança
e a santidade, mas apenas cancela
a punição externa,
que antigamente era imposta pelos
cânones?”
As teses não suscitaram
nenhuma discussão doutrinária
benévola, como talvez
supusesse o monge agostiniano.
Em agosto de 1518, institui-se
em Roma um processo contra Lutero,
devendo ali comparecer. Temendo
desagradar ao Príncipe
da Saxonia, que não esconde
simpatias por Lutero, a Cúria
concorda em que seja ouvido pelo
legado papel junto à Dieta
de Augsburgo. Desse depoimento
nada resulta, refugiando-se Lutero
em Nuremberg, com receio de violências
de parte da Igreja. Em janeiro
de 1519, por solicitação
do Príncipe da Saxonia,
redige documento conciliatório
pois até então
acreditava na possibilidade de
que a própria Igreja empreendesse
o caminho da reforma.
Na verdade, entretanto, Lutero
já se encontrava inteiramente
distanciado da interpretação
escolástica dominante.
Em seu espírito predominava,
então, uma visão
agostiniana do homem e o mais
completo desacordo com Aristóteles.
Assim, ainda em setembro de 1517,
redigiu uma espécie de
sumário de seu pensamento,
que se preservou, onde Santo
Agostinho é apresentado
diretamente como fonte inspiradora.
E, quanto a Aristóteles,
faz afirmações
desse tipo: “quase toda
a ética de Aristóteles é ruim
e inimiga da graça” ou
que “é um engano
julgar que a opinião de
Aristóteles sobre a bem-aventurança
não contraria a doutrina
católica”. Conclui
desta forma enfática: “Em
suma: todo Aristóteles
vale para a teologia o que representam
as trevas para a luz”.
Deste modo, discussões
públicas subseqüentes
só serviram para acentuar
o seu distanciamento da Igreja
de Roma. Em 1520, o Papa lança
uma Bula ameaçando-o com
a excomunhão. A reação
de Lutero equivalia a uma ruptura
frontal: a dez de dezembro queima
publicamente a Bula Papal.
Nos vinte e poucos anos que lhe
restaram de vida, Lutero procurou
ganhar o apoio da nobreza alemã,
incitando-a a rebelar-se contra
Roma e deixar de pagar-lhe tributos.
Diante da grande efervescência
criada pelos incidentes envolvendo
a pessoa de Lutero, o Imperador
do Sacro Império, Carlos
V, convocou uma Dieta (assembléia
política com a participação
de todos os monarcas de determinados
territórios, em geral
não muito extensos, denominados
de príncipes-eleitores,
isto é, incumbidos de
escolher o Imperador, assembléia
em que se discutiam impostos
e outros temas relevantes), em
1521, na cidade de Worms, na
qual Lutero não compareceu
para retratar-se e foi condenado.
Essa condenação
não teve qualquer eficácia
naqueles principados cujos governantes
simpatizavam com a causa de Lutero.
Em 1530, Carlos V faz uma nova
tentativa de reconciliação,
convocando a Dieta de Augsburg.
Para essa reunião e por
incumbência de Lutero,
Malanchton (1497-1560) redige
um documento que se tornou importante
na história da Reforma
(As confissões de
Augsburg). O evento somente
contribuiu para agravar as divergências.
Nessa altura, os príncipes
alemães que aderiram às
teses de Lutero haviam constituído
uma poderosa coalizão
militar. Depois da morte de Lutero
dá-se o conflito bélico
entre as duas facções,
que somente termina em 1555.
Nesse ano, firmada a paz de Augsburg,
assegura-se a liberdade religiosa
nos principados alemães.
Os súditos eram entretanto
obrigados a seguir a crença
escolhida pelo Príncipe,
devendo emigrar os que a isto
não desejassem submeter-se.
Consumada a ruptura com a Igreja
de Roma, além da atuação
política a que se dedicou
para granjear apoio entre os
príncipes alemães,
Lutero ocupou-se de dar estrutura à Igreja
que levaria o seu nome e a redigir
textos que explicitassem a nova
doutrina.
Lutero traduziu a Bíblia
ao alemão e exortou as
autoridades municipais e aos
seus seguidores no sentido de
que criassem escolas destinadas
a permitir que todos aprendessem
a ler. Criadas estas, incitou
os pais a que mandassem os filhos às
escolas.
Escreveu sobre o papel que as
obras humanas teriam na salvação,
e, em geral, sobre os diversos
aspectos da vida cotidiana, abrangendo
questões tais como a usura
e o comércio. Aproveitou
o ensejo da revolta camponesa
para fixar as relações
(de subordinação)
com o Poder temporal. Elaborou
dois catecismos. Embora volumosos,
os textos que nos legou são
considerados dispersos, inexistindo
um corpo de doutrina e presumivelmente
sequer estivesse preocupado em
elaborá-la. Dentre aqueles,
os estudiosos destacam De
servo arbítrio, que
redigiu para se contrapor a Erasmo.
(Ver também De servo
arbítrio, de LUTERO; e CALVINO).
(1) Lutero
mereceu diversas biografias,
a mais famosa de autoria
do escritor francês
Michelet ( Memoires de
Luther, Paris, 1837).
Seu contemporâneo e
amigo Melanchton também
escreveu uma história
de sua vida, aparecida em
1549. Em português
publicou-se Martin Lutero,
de Funck Brentano (Rio de
Janeiro, Vechi, 2ª ed.,
1956) e O que Lutero
realmente disse (Rio
de Janeiro, Civilização
Brasileira, 1971). A Editorial
Paidós, de Buenos
Aires, publicou a tradução
espanhola das Obras de
Martim Lutero, em sete
volumes.
Voltar
|
|
|