(O)
Livre Arbítrio,
de Santo Agostinho
O Livre Arbítrio tornou-se
um dos mais renomados textos
de Santo Agostinho. Acha-se subdividido
em três livros. O primeiro
está dedicado à comprovação
da tese de que o pecado provém
do livre arbítrio; o segundo
contém uma demonstração
da existência de Deus,
tema que absorveria a atenção
da filosofia católica,
sobretudo na Idade Média;
e, o terceiro em que se detém
na exaltação da
obra de Deus e aborda também
questões que lhe pareceram
achar-se correlacionadas à ordem
divina e que formam uma lista
extensa (o que é preciso
crer e que tipos de erros prejudicam
a nossa felicidade; a morte prematura
das crianças e o sofrimento
que padecem não são
contrários á ordem
universal; o primeiro pecado
do homem e o demônio; foi
o homem criado em estado de sabedoria
ou de insensatez; etc.).
Preocupava a Santo Agostinho
a questão da existência
do Mal. Os maniqueístas,
com cujos princípios simpatizara,
afirmavam a existência
de dois princípios vitais,
de igual importância: o
Bem e o Mal. Em presença
deste último, concluíam,
os homens não são
culpados de ações
classificadas como más.
Para refutar essa doutrina, Santo
Agostinho irá partir da
tese de que não se deve
atribuir a Deus mas ao homem
a presença do Mal. Este
foi criado dispondo de livre
arbítrio, com direito
a fazer uso de sua liberdade.
Em conseqüência, o
pecado decorre exclusivamente
do livre arbítrio do homem.
Santo Agostinho irá explicitar
que se trata de moral e não
de males físicos (doenças,
sofrimentos e morte). Atendo-se
estritamente aos ensinamentos
cristãos, entende que
os males físicos são
uma decorrência do pecado
original. Os sofrimentos experimentados
no corpo correspondem à penalidade
imposta à humanidade em
decorrência do primeiro
pecado.
A tradição grega
da qual se louva Agostinho, havia
estudado detidamente a natureza
dos atos humanos, isolando aqueles
que não correspondem a
reações automáticas,
instintivas, e impõem
uma escolha. Esta depende da
vontade que, para mover-se e
impulsionar a ação,
requer ser determinada. Como
há muitos bens no mundo,
aquela determinação
não poderá prescindir
de uma opção. Os
gregos, entretanto, não
chegaram ao conceito de liberdade,
desenvolvimento que seria da
lavra de Santo Agostinho.
Como se indicou, o problema de
Santo Agostinho diz respeito às
ações de natureza
moral. Dispondo do livre arbítrio,
a criatura humana pode optar
por bens inferiores. Dessa verificação
não se pode inferir que
o livre arbítrio seja
um mal. Agostinho enfatiza que
ter recebido de Deus uma vontade
livre é para nós
um grande bem. O mal é o
mau uso desse grande bem.
Como se dá que o homem
incline-se pela escolha do bem
e recuse o mal? No texto de O
livre arbítrio, Agostinho
não conseguiu precisar
com toda a clareza que a determinação
da vontade, para leva-la à preferência
pelo bem, seja uma resultante
da interveniência da graça
divina. Tal esclarecimento ocorreria
mais tarde. A discussão
suscitada pelas teses agostinianas,
em seu próprio tempo,
levou-o a abordar muitas delas
no texto que intitulou Retractationes,
entre as quais a que diz respeito à determinante
no caso do livre arbítrio.
Adotada na Idade Média,
a hipótese agostiniana
--de que a ação
moral supõe a presença
da graça divina --viria
a ser recusada pela Filosofia
Moderna. A alegação
básica seria a seguinte: sendo
externa a intervenção
para ocasionar a determinação
da vontade, automaticamente retira
o caráter de voluntária à ação
daí decorrente. Entre
as alternativas surgidas, sobressai
a kantiana. Procurando atender à nova
situação, de emergência
e consolidação
do pluralismo religioso, Kant
formulou uma doutrina independente
de todo suporte religioso, isto é,
puramente racional. Trata-se
de uma fórmula que permitiria,
ao autor da ação,
avaliar de sua moralidade, o
que, por si só, naturalmente,
não o obrigará a
ater-se ao que estaria em concordância
com o princípio moral.
Contudo, Kant entende que a verdadeira
liberdade seria correspondente à recusa
de ceder às inclinações
e escolher a lei moral (Ver também SANTO
AGOSTINHO e Fundamentação
da metafísica dos costumes,
de Kant)
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