História
da Arte, de
Ernst Gombrich
A História da Arte,
de Ernst Gombrich (1909/2001),
corresponde a um dos empreendimentos
literários melhor sucedidos.
Propõe-se difundir uma
das dimensões fundamentais
da cultura geral, sem se preocupar
com erudição mas
apenas buscando cultivar o hábito
de aproximar-se da arte de forma
descontraída e respeitosa.
O sucesso dessa obra pode ser
medido pelo fato de que, desde
o seu aparecimento em 1950, mereceu
16 edições na Inglaterra,
foi traduzida nas principais
línguas e já vendeu
milhões de exemplares
em todo o mundo. Para compô-la,
Gombrich estabeleceu como regra
que as ilustrações
deveriam aparecer na própria
página em que são
mencionadas. A edição
brasileira tem cerca de 500 páginas.
As ilustrações
correspondem a 398. O propósito
claro consiste em colocar a sua
informação ao alcance
do grande público, acreditando
que conseguiria desestimular
atitudes deste tipo: “Por
vezes, vemos pessoas caminhando
por uma galeria de arte, de catálogo
nas mãos. Toda vez que
passam diante de um quadro buscam
pressurosamente seu número.
Podemos observá-los folheando
seu livro e, logo que encontram
o título ou o nome da
obra, seguem em frente. Não
faria diferença alguma
se tivessem ficado em casa, pois
mal olharam para a pintura. Apenas
checaram o catálogo. É uma
espécie de curto-circuito
mental que nada tem a ver com
a fruição de um
quadro”.
Gombrich quer sobretudo fornecer
um roteiro básico dos
principais momentos da arte,
buscando dar indicações
precisas sobre o que a seu ver
seria essencial, sem qualquer
preocupação de
exaurir cada um dos aspectos
abordados, todos suficientemente
ilustrados. No que chamou de “estranhos
começos”, distinguiu
as imagens, dos povos primitivos
e pré-históricos,
que nos foram preservadas em
cavernas e objetos, daquela que
pretendeu ser “arte para
a eternidade” (Egito, Mesopotâmia
e Creta). Batizou o aparecimento
da arte grega como sendo “o
grande despertar” e fixou-a
na pátria de origem, no
mundo grego e na bifurcação
dos caminhos entre Roma e Bizâncio
(séculos V a XIII). A
Idade Média está presente
no que chamou de Igreja militante
e Igreja triunfante. O Renascimento
e seus desdobramentos são
apresentados de forma circunstanciada.
A tese de Gombrich é de
que não há Arte
de forma abstrata mas a obra
de artistas vinculados ao seu
tempo. A título ilustrativo
vejamos como situa a questão:
“Sabemos muito bem que, em arte, não podemos falar de progresso
na acepção em que falamos de progresso do saber. Uma obra de
arte gótica pode ser tão grande quanto uma obra da Renascença.
Não obstante, talvez seja natural para as pessoas desse tempo, que ao
entrarem em contato com as obras primas do Sul, sua própria arte tenha
parecido subitamente obsoleta e grosseira. Foram três as realizações
tangíveis dos mestres italianos para as quais eles podiam apontar. Uma
foi a descoberta da perspectiva científica, a segunda o conhecimento
da anatomia – e, concomitantemente, a representação perfeita
do belo corpo humano – e, em terceiro lugar, o conhecimento das formas
clássicas de construção, as quais pareciam simbolizar,
para as pessoas desse período, tudo que era digno e belo. É um
espetáculo fascinante observar as reações de vários
artistas e tradições ao impacto causado por esse novo saber,
e ver como se afirmaram ou, o que por vezes aconteceu, como sucumbiram – de
acordo com a força de caráter e a largueza de visão”.
(Capítulo 17, p. 260/261).
As principais teses de Gombrich
poderiam ser resumidas como segue:
a) não há razões
erradas para gostarmos de um
quadro. Podem entretanto existi-las para
não gostar; b) a
propensão para gostarmos
apenas do que é bonito
pode se converter num obstáculo
se nos levar a rejeitar obras
que representam um tema menos
atraente; c) gosto e padrões
do que é belo variam imensamente.
Por isto podemos levar algum
tempo para perceber a beleza
intrínseca de determinada
obra; d) o artista verdadeiro
busca alcançar o equilíbrio
correto entre as figuras, uma
relação certa que
culminasse no todo mais harmonioso;
e, e) é natural que as
pessoas gostem do que aparenta
estar próximo da realidade.
Contudo, geralmente não é a
circunstância de que busquem
distorcê-la que nos choca
mas o fato de que, ao fazê-lo,
revelem insuficiente conhecimento
do metier.
A última observação,
de certo modo, acha-se relacionada à pintura
moderna. No pós-escrito
(“A cena incerta”)
aborda especificamente essa questão
partindo da admissão de
que a evolução
da arte simboliza tipos de sociedade
(sem com a tese queremos simplesmente
indicar que “os gregos
não poderiam ter construído
o Rockfeller Center”).
Contudo, “torna-se suficiente
que qualquer estilo ou experiência
seja proclamado contemporâneo para
que a crítica sinta a
obrigação de o
entender e o promover”.
Para ilustrar a afirmativa de
que não basta distorcer
a realidade para merecer o rótulo
(e o aplauso) de “moderno” ou “pós-moderno”,
na Introdução,
Gombrich confronta dois desenhos
de Picasso, o primeiro de 1938
(“encantadora reprodução
de uma galinha com seus fofos
pintinhos”) e, o segundo,
uma ilustração
para a História Natural de
Buffon, quando não se
contentou em fazer a mera reprodução
física da ave, no caso
um galo, conseguindo também “expressar
sua agressividade, sua insolência
e estupidez”.
A História da Arte de
Gombrich é uma obra merecedora
de freqüentes revisitas,
pois, como escreve: “Nunca
se acaba de aprender com a arte.
Há sempre novas coisas
a descobrir”. (Ver também GOMBRICH,
Ernst).
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