Dicionário das Obras Básicas da
Cultura Ocidental

Antonio Paim

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EURÍPEDES

Eurípedes nasceu em 480, em Salamina, e morreu em 406, na Macedônia, onde se achava a convite do rei (Arquelau), no mesmo ano em que faleceu Sófocles. Enquanto este completara 89 anos, sendo bem mais moço, Eurípedes morreu aos 74 anos. Sua primeira peça teria sido encenada em 438, aos 42 anos. Sua atividade teatral desenvolveu-se portanto ao longo das três décadas subseqüentes, quando o acontecimento marcante correspondia à Guerra do Peleponeso, que se iniciara em 432. Eurípedes não assistiria ao seu desfecho, com a derrota de Atenas, ocorrido em 405, um ano após a sua morte.

Teria escrito 92 peças, das quais restaram 18. Ainda que não exista classificação consensual, é possível destacar desse legado alguns conjuntos através dos quais sua obra tornar-se-ia perenemente festejada.

A exemplo de Ésquilo e Sófocles, dentre as peças preservadas as grandes famílias malditas da mitologia grega ocupam lugar destacado, a Labdicida (Édipo e descendência) e a Atridas (Agamenon e descendência). Em relação à primeira, Eurípedes recupera os antecedentes registrados na mitologia. A peça Os fenícios resume a história de Tebas, numa versão diversa da conhecida em relação a Jocasta (a mãe de Édipo que se torna sua esposa), que aparece como uma velha, sem referência ao fato de que se teria enforcado ao descobrir a verdade de seu trágico destino. Dentre os membros dessa família maldita, são personagens Antígona (cuja saga é tema da peça de Sófocles assim denominada), bem como seus irmãos (Eteocle e Polinice). Estes são os principais personagens da peça Os Sete contra Tebas, de Ésquilo e também na peça Os suplicantes, do próprio Eurípedes.

Na peça Os fenícios, Eurípedes coloca ao próprio Édipo. Outra de suas peças relacionadas aos antecedentes dos Labdicidas é As bacantes. Está dedicada a Dionísio, deus da vegetação e do vinho, filho de Zeus e Semele, também chamado de Baco. Dionísio volta à sua terra natal (Tebas) e depara-se com a hostilidade da própria família. A peça fixa a maneira como se estabeleceu o culto de Dionísio, que consiste de verdadeiras orgias. Friedrich Nietzsche (1844/1900) procurou enfatizar o contraste entre essa linha orgiátisca (dionisíaca) e o culto da racionalidade (apolínea, por referência a Apolo, deus da beleza, das letras e das artes), ambas existentes na Grécia Antiga.

Contudo, o grande tema de Eurípedes parece ter sido Agamenon e sua descendência. Esta é objeto de quatro peças (Ifigênia em Tauride; Ifigênia em Aulis; Eletra e Orestes). O comandante das tropas gregas na guerra de Tróia é a grande presença de Hecuba; As troianas e Helena. Alguns estudiosos consideram entretanto que o tema da guerra é o que de fato o teria mobilizado, à vista da presença desta na vida cotidiana da Atenas de seu tempo, embora todos reconheçam ser temerário associar a obra dos grandes dramaturgos gregos à problemática que lhes era contemporânea. Ainda assim, Os suplicantes é destacada como sendo uma franca condenação à guerra.

O tema de Os suplicantes é a questão do direito dos mortos ao enterro de forma que possa o seu túmulo ser velado pelos parentes próximos, direito que não é reconhecido em Tebas. Na disputa do trono com o irmão, Polinice se alia aos chamados “sete chefes” de Argos, de que resulta a morte tanto dos filhos de Édipo em disputa como de seis dos guerreiros de Argos, e o problema de sepultá-los em território adequado. Na condição de rei de Tebas, Creon (irmão de Jocasta) recusa a Polinice o direito de ser ali enterrado, o que provoca a revolta de Antígona. Teria procedimento análogo em relação aos guerreiros de Argos mortos no conflito. Os três grandes dramaturgos trataram do tema a seu modo. Na peça de Eurípedes é o sobrevivente daquela disputa, Afraste, rei de Argos, que secunda a reivindicação das viúvas e demais parentes. O incidente prenuncia novo conflito. Solicitado a intervir, Teseu, rei de Atenas, deixa entrever que para reconquistar cadáveres, parece absurdo que seja necessário aumentar o seu número, fazendo surgir novas vítimas que, por seu turno, deixarão inconsoláveis as outras mães que também vão querer prestar-lhes as últimas honras. O sem sentido da guerra transparece igualmente no que se poderia denominar de “ciclo troiano” do autor.

Obtiveram grande sucesso de público, no Ocidente, duas personagens femininas presentes às peças de Eurípedes: Medéia e Fedra. Duas mulheres tão ensandecidas pelo amor que as leva a toda sorte de desatinos (Ver também Hipólito e Medéia, de Eurípedes; Hecuba e As troianas, de Eurípedes; e ÉSQUILO e SÓFOCLES).

 

 

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