Ensaio
sobre neutralidade axiológica, de
Max Weber
O Ensaio sobre neutralidade
axiológica nas ciências
sociológicas e econômicas
teve uma primeira versão
que Max Weber apresentou para
discussão na Associação
de Política Social, de
Berlim, em 1913, refundido-a
mais tarde e divulgando-a em
1917. Esse texto tornou-se uma
referência fundamental
no processo de formalização
da sociologia e determinação
de seu objeto.
O termo axiologia (do grego axiologos,
digno de ser dito) começou
a ser empregado no começo
do século para designar
o estudo dos valores que então
se estruturava, no ciclo inicial
abrangendo apenas os valores
morais e, subseqüentemente,
os demais. Weber o emprega no
sentido amplo.
O propósito principal
de Weber consiste em estabelecer
uma nítida distinção
entre o registro dos fatos e
as avaliações valorativas.
As ciências sociais lidam
com fatos acerca dos quais determinadas épocas
os apreciaram de modo diferente
(a escravidão, por exemplo)
e em relação aos
quais posicionam-se os próprios
homens de ciência. A distinção
parece-lhe fundamental a fim
de fazer progredir a investigação.
Insiste em que os sociólogos
dificilmente chegarão
a um acordo quanto à maneira
de avaliar este ou aquele fato.
Contudo, proposta e aceita a
escolha saberão como estudá-lo
de modo sistemático e
de forma que suas conclusões
possam ser aceitas ou refutadas
considerado apenas o método
empregado na análise.
Assim, o procedimento científico
recomendado para as ciências
sociais é o que denominou
de neutralidade axiológica.
No texto, Weber discute vários
temas correlatos. O que então
apaixonava o professorado era
a questão da liberdade
de cátedra, que poderia
ser usada para proselitismo político.
Nesse particular, Weber irá demonstrar
que não há, em
matéria política
e de convivência social,
um ponto de vista privilegiado
que pudesse justificar a superioridade
do professor, razão pela
qual seria uma imoralidade valer-se
de sua posição
para tentar influenciar os alunos.
No que se refere à ética,
abordará a proposta kantiana,
formulada na Fundamentação
da metafísica dos costumes,
com o propósito de preservar
o seu núcleo fundamental
mas desenvolvê-la a fim
de substituir o homem universal
abstrato, que Kant tem em vista,
pela pessoa humana situada numa época
e num espaço territorial.
Mais tarde na obra A política
como vocação a
batizará como ética
de responsabilidade.
A intelectualidade alemã de
seu tempo discutia também
com grande intensidade a questão
teórica geral das ciências
sociais, havendo nitidamente
uma disputa entre os que entendiam
devessem adotar procedimentos
idênticos aos empregados
nas ciências naturais,
centrados na medida e na quantificação,
e os que propugnavam pela busca
de sua especificidade. Nesse
contexto é que surge a
idéia de que, além
de objetos naturais, estudados
pela física, pela química
e pela biologia, existe o que
se denominou de objetos referidos
a valores, isto é,
os que compunham o mundo da cultura.
Levando em conta essa circunstância – e
as que referimos anteriormente –,
compreende-se a abrangência
dos temas considerados no Ensaio.
De todos os modos passou à história
como marco na constituição
da sociologia, o que pode ser
visualizado a partir da discrição
esquemática adiante inserida.
Os grandes tratadistas costumam
classificar a sociologia como
tendo experimentado um ciclo
inicial de natureza sintética,
substituído posteriormente
por uma visão analítica. No
primeiro caso, teria o propósito
de abranger a totalidade dos
fenômenos sociais. Nessa
fase, Augusto Comte (1798-1857)
distingue-se de Herbert Spencer
(1820-1903) pelo fato de que
o fundador do positivismo imaginava,
ao empregar o termo sociologia,
estar falando de ciência
capaz de dominar os fenômenos
sociais em proveito do homem,
criando uma espécie de
sociedade racional; enquanto
o filósofo inglês,
aceitando o termo comteano modificou-lhe
o sentido ao separá-la
da ética, circunscrevendo
os seus limites à tarefa
puramente descritiva da sociedade,
mas ainda tomada como um todo.
Estava dado um passo essencial
no sentido de colocar esse tipo
de investigação
em bases científicas,
direção na qual
marchou a chamada visão
analítica, complementando-o
pela delimitação
estrita do campo a ser pesquisado.
Interessa-se por aspectos particulares
dos fenômenos sociais e
evita as grandes generalizações
ou, pelo menos, deixa-as na dependência
dos resultados concretos da consideração
de aspectos limitados. Émile
Durkheim (1858-1917) seria o
iniciador desse novo ciclo, notadamente
na obra Regles de la méthode
sociologique (1895).
Essa perspectiva analítica
esbarrou com a questão
da presença dos valores,
de modo inarredável, na
ação humana, o
que parecia conduzir ao conflito
inevitável das avaliações.
Max Weber solucionou a controvérsia
ao mostrar que a pesquisa empírica
pode ater-se a parâmetros
rigorosamente científicos,
desde que se admita a possibilidade
de múltiplas valorações,
dando origem a diversidade de
avaliações. Na
fase da pesquisa, os estudiosos
podem colocar-se de acordo; ao
tempo em que as avaliações
extrapolam o plano científico,
razão pela qual devem
ser evitadas se se deseja ater-se
ao mencionado plano. A isto,
como indicamos, Weber denominou
de neutralidade axiológica.
Assim, o processo de constituição
da sociologia como ciência
abrange grande parte da segunda
metade do século XIX e
as duas primeiras décadas
deste século, coroando-se
com o Ensaio ora considerado.
(Ver também WEBER,
Max).
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