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Dicionário das Obras
Básicas da
Cultura Ocidental
Antonio Paim
Índice: a - b - c - d - e - f - g - h - i - j - k - l - m - n - o - p - q - r - s - t - u - v - x - w - z
(A) Educação
para o homem moderno,
de Sidney Hook
Sidney Hook (1902-1989) foi um
dos mais destacados discípulos
de John Dewey e da corrente filosófica
norte-americana denominada de pragmatismo.
Ensinou filosofia na Universidade
de Nova York a partir de 1934.
Socialista e apreciador de Marx,
considerava a experiência
soviética a grande tragédia
do século, na medida em
que atentava contra o sistema
democrático-representativo,
justamente a grande conquista
da humanidade. Tornou-se o principal
defensor da tradição
de proceder-se à leitura
das obras clássicas, como
condição de permanência
na universidade, sendo justamente
o autor de um entendimento das
humanidades que encerrou uma
polêmica clássica
na obra que caracterizaremos
a seguir. Quando se pretendeu
nos Estados Unidos que a seleção
de leituras, nos institutos universitários
chamados de Liberal Arts,
adotasse critérios políticos,
apresentou um argumento digno
de registro em relação
a Santo Agostinho. Reclamava-se
a inclusão de um autor
negro, por essa simples condição.
Hook lembrou que Santo Agostinho
era do Norte da África
e as descrições
de sua pessoa, que chegaram até nós,
indicam que tinham a pele escura.
Porém, a sua presença
no Canon Ocidental em momento
algum levou em conta tal circunstância,
mas apenas o significado de sua
obra para a nossa cultura.
O livro Educação
para o homem moderno esteve
relacionado à grande polêmica
verificada nos Estados Unidos,
na década de trinta do
século XX – e que
prosseguiu no pós-guerra – a
propósito do conteúdo
da educação. Encontrava-se
subjacente uma questão
não resolvida a propósito
da disputa entre ciência
moderna e cultivo das humanidades,
que era tradição
da Universidade medieval. Como
se sabe, essa disputa tornou-se
extremamente radical, nos séculos
XVIII e começos do seguinte,
em alguns países, como
França e Portugal, onde
terminou pela criação
de nova instituição
universitária ou pelo
simples fechamento da Universidade
existente. Ao longo do século
XIX ocorreu certa acomodação.
Aos poucos o próprio aristotelismo – que
chegou a ser proibido – foi
reavaliado com serenidade. Na
Alemanha estruturou-se um modelo
de Universidade destinada a promover
a pesquisa científica,
sem embargo da presença
da cultura humanista. Quase por
toda parte o estudo das obras
clássicas foi transferido
ao nível colegial.
Sem embargo, faltava um debate
aprofundado onde o tema fosse
considerado com a amplitude requerida.
Esta oportunidade surgiu quando
renomados educadores, na Universidade
de Boston, resolveram contrapor
o ensino das humanidades segundo
o modelo consagrado nos Estados
Unidos, sob a influência
de John Dewey, onde a ciência
tinha a primazia. Hook concebeu
o livro como um ataque àquela
iniciativa, apresentada abertamente
como aristotélico-tomista,
e esta seria a característica
da primeira edição,
aparecida em 1945. Depois refundiu-o,
resumindo aquele debate e apresentando
o seu principal resultado, para
a segunda edição,
de 1963, tornada definitiva e
sucessivamente reeditada.(1)
Nos EE.UU. consagrou-se o entendimento
de que haveria, como contrapostas,
uma cultura científica
e uma cultura humanista. Procurando
superar esse tipo de postulação,
Hook irá demonstrar que
o cultivo das humanidades não
pode ser entendido como culto
abstrato do passado. Ao contrário
disto, trata-se de equipar-se
para o presente. Se é assim,
não se pode dar as costas
para autores e questões
contemporâneas, como se
tornou praxe em algumas universidades
americanas. Sobretudo, não
se pode ignorar a ciência
moderna nem perseverar o conflito
com a filosofia aristotélico-tomista,
formulada antes do aparecimento
da ciência.
O grande mérito de Hook
consiste em haver definido a
educação moderna
como educação liberal
e em tê-la caracterizado,
a bem dizer, de modo exaustivo.
Diz textualmente: “A função
de uma educação
liberal no mundo moderno é insuflar
alguma ordem nos espíritos
que herdaram tradições
conflitantes. Devemos fundir
os problemas e materiais do mundo
moderno num molde reconhecível
pelo qual os indivíduos
possam orientar-se para uma vida
plena e responsável”.
Não se furta em referir
de modo concreto o desdobramento
desta proposta. Antes de mais
nada, afirma que a pessoa liberalmente
educada deve estar familiarizada
com o conhecimento científico
da natureza física. Em
se tratando da formação
geral, não é indispensável
o conhecimento do que se contém
nos manuais mas apenas e sobretudo
os grandes textos científicos
em seus respectivos momentos
históricos. A par disto, “a
todo estudante deve ser solicitado
que se torne inteligentemente
consciente de como funciona a
sociedade em que vive, das grandes
forças modeladoras da
civilização contemporânea
e dos problemas cruciais de nossa época,
ainda aguardando solução”.
Os estudos sociais seriam, pois,
fundamentais no currículo
da moderna educação.
Subseqüentemente, a escola
deve facultar a imprescindível
familiaridade com os valores
de nossa civilização.
Não basta, também,
ter acesso aos conhecimentos
indicados, sendo imprescindível
compreender os procedimentos
adotados na sua obtenção,
o que pode ser alcançado
pelo estudo da lógica
ou do método científico.
A literatura é igualmente
parte integrante da formação
geral, do mesmo modo que o conhecimento
da língua pátria,
de alguma língua estrangeira,
da música e das artes.
Embora reconheça o lugar
da religião na vida humana,
não considera adequado
o seu ensino diretamente nos
sistemas de ensino, já que
se trata de uma função
das igrejas. Conclui: “Os
que não são educadores
profissionais podem pensar que
semelhante programa é chocantemente “pedante” e
irrealista. Mas logo que se faça
o devido desconto para as diferenças
de capacidade das crianças,
nas diversas idades, na preparação
dos materiais de ensino, temas
dominantes e técnicas
específicas de instrução –,
o ar de paradoxo e irrealismo
desaparecem logo”. (Ver
também Democracia
e educação,
de JOHN DEWEY).
(1)
Esta versão veio a
merecer tradução
brasileira: Rio de Janeiro,
Zahar Editores, 1965.
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