Doutrina da virtude, de
Kant
Além da Fundamentação
da metafísica dos costumes (1785),
Kant publicou ainda dois outros
livros dedicados à moral: Crítica
da razão prática (1788)
e Doutrina da virtude (1797).
A Crítica da razão
prática atende tão
somente à intenção
sistemática do autor,
já que estava convencido
devesse o sistema seguir-se
ao conjunto das críticas.
Não foi entretanto bem
sucedido, sendo esta tarefa (de
conceber um sistema de inspiração
crítica, isto é,
segundo a perspectiva transcendental)
empreendida por seus sucessores.
Deste modo, para perfeito entendimento
da ética kantiana são
suficientes a primeira e a última
das obras antes referidas.
A Doutrina da virtude está dividida
em duas grandes seções,
sendo a primeira dedicada aos
deveres para consigo mesmo e,
a segunda, aos deveres para com
os outros. Antes de apresentá-los
estabelece esta distinção
especial: a ética não
dá as leis para as ações,
pois esta é a esfera do
direito, mas apenas para as máximas
das ações. As máximas
correspondem ao enunciado subjetivo
que precede a ação
concreta e a enuncia. Segundo
estabelece a Fundamentação
da Metafísica dos Costumes,
para averiguar se determinada
máxima seria moral, basta
enunciá-la de modo universal,
isto é, estabelecer que
todos os indivíduos poderiam
agir da mesma maneira.
Desde Aristóteles, diversos
autores seguiram a tradição,
que inicia, de elaborar uma tábua
de vícios e de virtudes.
Na Época Moderna, assim
procederam, entre outros, Hobbes
e Espinosa. Entretanto, Kant
distingue-se de todos os predecessores
ao rejeitar a possibilidade de
construir-se uma doutrina da
virtude a partir dos sentimentos
morais. Embora reconheça
esta presença na moralidade,
o que explica aquilo que seria
o seu simples conhecimento racional,
ao atestar a capacidade de todas
as pessoas de emitir juízos
morais. O conhecimento filosófico,
entretanto, parte do reconhecimento
de que o cumprimento da lei moral
não tem em vista a conquista
da felicidade mas impõe-se
como puro respeito ao dever.
Na visão kantiana, é a
partir da consideração
deste que se deve conceber a
doutrina da virtude. Por isto,
divide-a segundo o ordenamento
racional dos deveres.
No exame dos deveres para consigo
mesmo, Kant examina temas como
o suicídio; o embrutecimento
decorrente do uso imoderado dos
prazeres sensíveis; a
mentira e a avareza. No corolário
desse exame recomenda à pessoa
humana que procure conhecer-se
a si mesmo como meio de busca
eficaz da perfeição
moral.
Guardam maior interesse os deveres
para com os outros, tendo em
vista a profundidade e a pertinácia
de suas considerações
sobre certos sentimentos sobre
os quais valeria a pena debruçar-se.
As relações com
os outros, segundo Kant, deveriam
ser pautadas, antes de mais nada,
pelas regras do amor. Embora
não o explicite, trata-se
do princípio cristão
do amor do próximo. Este
desdobra-se em beneficência
(hábito de praticar o
bem, que apresenta nestes termos: “ajudar,
segundo os seus meios, sem nada
esperar por isso, àqueles
que estão na miséria,
a reencontrar a felicidade”);
reconhecimento (“honrar
uma pessoa em razão de
um benefício que se recebeu
dela”) e simpatia. A meditação
moral inglesa, contemporânea
de Kant, desenvolveu grandemente
o tema da simpatia, notadamente
David Hume e Adam Smith, como
sendo aquele sentimento que induziria
as pessoas a cumprir a lei moral,
a fim de merecê-la de seus
concidadãos.
A tal conjunto de deveres opõem-se
estes vícios: a inveja,
a ingratidão e a alegria
obtida pela infelicidade de outrem.
A inveja é um sentimento
mal são porquanto a destruição
do objeto invejado em nada beneficia
o invejoso. Afirma taxativamente
que os vícios enumerados
acham-se inscritos na natureza
do homem.
Kant aborda ainda as virtudes
que decorreriam do respeito que
se deve dedicar aos outros (modéstia,
moderação e reconhecimento
de sua dignidade) a que se oporiam
estes vícios: o orgulho,
a maledicência e a zombaria.
Finalmente, Kant tece considerações
sobre o significado da amizade.
(Ver também KANT).
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