Dicionário das Obras Básicas da
Cultura Ocidental

Antonio Paim

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Defesa do racionalismo ou análise da fé, de Amorim Viana

O livro Defesa do racionalismo ou análise da fé (1866) constitui manifestação expressiva do denominado movimento da religião natural, que envolveu numerosos pensadores, sobretudo ingleses e franceses, no século XVIII. Na Inglaterra, foi também denominado de deísmo, tendo sofrido alguma radicalização ao ser transposto ao continente, onde se torna parte do chamado Iluminismo, que ambiciona tirar as últimas conseqüências do racionalismo. No Dicionário de Filosofia (1968; tradução brasileira, 1970), Abbagnano resume deste modo as teses fundamentais do deísmo: 1ª) a religião não contém e não pode conter nada de irracional; 2ª) a verdade da religião, portanto, revela-se à própria razão e a revelação histórica é supérflua; 3ª) as crenças da religião natural são poucas e simples: existência de Deus; criação e governo divino do mundo; recompensa do bem e punição do mal em uma vida futura. As religiões existentes teriam, assim, um fundamento racional que os pensadores em causa tratam de explicitar.

Na passagem do deísmo inglês para o continente ocorre uma restrição significativa. Enquanto os deístas ingleses atribuem a Deus não só o governo do mundo físico (suporte último das leis naturais), mas também do mundo moral, os franceses negam que Deus se ocupe dos homens. Voltaire(1) acha mesmo que Deus manifesta a mais radical indiferença quanto ao seu destino.

Pedro Amorim Viana 1822-1901) nasceu em Lisboa, estudou humanidades num colégio organizado, em Paris, por um frade português exilado, destinado a jovens portugueses e brasileiros e, de volta a Portugal, concluiu os cursos de Matemática e Filosofia na Universidade de Coimbra. Dedicou-se ao ensino, primeiro como professor de Lógica no Liceu Nacional de Lisboa e depois como Lente de Matemática na Academia Politécnica do Porto.

Desenvolveu uma grande atividade intelectual, editando diversos periódicos. Discutiu temas relacionados às doutrinas econômicas de seu tempo e à filosofia, empenhando-se também na divulgação das inovações científicas e tecnológicas em curso na Europa. Contudo, a paixão de sua vida consistiu na adequada formulação de uma religião racional. Ao tema dedicou um livro – Defesa do Racionalismo ou Análise da Fé (1866), que teve uma influência decisiva no curso ulterior da meditação filosófica portuguesa.
A exemplo do deísmo inglês do século XVIII, discute exaustivamente a natureza e o sentido dos dogmas. Acredita no progresso infinito da humanidade, progresso esse que é sobretudo de natureza moral, e deixa à religião o papel decisivo nesse aprimoramento moral. Para cumprir semelhante objetivo, contudo, deve fugir à superstição e ao dogmatismo. (Ver também A religião nos limites da simples razão, de KANT).


(1) Voltaire (1694-1778), por sua pregação libertária e anti-clerical, granjeou enorme nomeada na Europa de seu tempo, sendo autor de obra muito extensa. Os chamados enciclopedistas franceses também simpatizavam com a hipótese da religião natural. Na Inglaterra, por sua vez, mereceu a adesão de muitos intelectuais destacados, entre estes David Hume (1711-1776). Kant poderia ser agregado à corrente, embora tardia essa adesão.

 

 

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