ESPINOSA, Baruch
Espinosa nasceu em 1632, na cidade
de Amsterdã, e morreu
em 1677 em Haia, a 21 de fevereiro.
Em novembro do mesmo ano foi
publicada a maior parte de
suas obras, sob o título
de Obras Póstumas.
O grande pensador e crítico
português, Joaquim de Carvalho
esclareceu com precisão
as origens judaico-portuguesas
de Baruch de Espinosa. Filho
de Miguel de Espinosa (natural
de Vifigueira, Portugal), e de
Hanna Debora Espinosa, segunda
mulher de Miguel. Hanna Debora,
a mãe, muito provavelmente
era portuguesa. Tendo falecido
quando Baruch contara 5 anos
de idade, a educação
da criança ficou a cargo
da madrasta, Ester de Espinosa,
natural de Lisboa. Embora o nosso
autor conhecesse várias
línguas, foi o português
a sua língua-familiar.
A respeito, escreve Joaquim de
Carvalho: “O hebreu, o
latim, e o holandês foram
sem dúvida os instrumentos
da sua formação
filosófica e científica;
mas temos por certo que a língua
familiar da puerícia e
adolescência foi o português”.
O pai de Baruch emigrou de Portugal
e se estabeleceu em Amsterdã,
desde fins de 1623 até 28
de março de 1645, data
do seu falecimento.
Baruch teve duas irmãs,
Rebeca e Miriam, sendo que esta,
a mais nova, casou com Samuel
Carceres, judeu português,
com quem teve um filho, Daniel
Carceres, que se apresentou,
junto à sua tia Rebeca,
como herdeiro do espólio
do Filósofo, segundo foi
informado por Johann Kohler.
Era grande o ramo dos Espinosas
portugueses (os havia também
espanhóis): ao longo dos
séculos XVI e XVII, encontravam-se
famílias com esse sobrenome
em Viana do Castelo, Guimarães,
Lamego, Leiria, Faro, Açores,
Porto, Lisboa e Évora.
Cristãos-novos, os Espinosas
portugueses foram sempre acusados
de cripto-judaísmo. Conforme
escreve Joaquim de Carvalho, “(...)
em todas as províncias
de Portugal viveram nos séculos
XVI e XVII indivíduos
de apelido Espinosa – apelido
este caiu em desuso do século
XVIII em diante, talvez porque
os vitupérios contra o Maledictus importassem
para os seus portadores a suspeita
de cripto-judaismo.
Se alguns se apresentavam como
cristãos-velhos, e até enobrecidos
pela prosápia dos Espinosas
castelhanos, a maioria, porém,
mal pode velar a ascendência
israelita e a prática
secreta do judaísmo. Miguel
de Espinosa pertencia, sem dúvida,
a uma família de marranos,
porque só demandavam Amsterdã os
corajosos a quem a forçada
dissimulação interiormente
vexava e publicamente aspiravam
a invocar o Eterno e a viver
segundo a Lei”.
Todos os biógrafos de
Espinosa concordam nas suas origens
judaico-portuguesas e na sua
naturalidade holandesa (Amsterdã),
desde os mais antigos como Jean
Maximilien Lucas e o pastor Johann
Kohler (Colerus), passando por
Willelm Meijer. Pierre Bayle,
Freudenthal, Meinsma, Dunin Borkowsky
e chegando até os portugueses
Antonio Ribeiro dos Santos, José Agostinho
de Macedo e Inocêncio Francisco
da Silva. Maximilian Lucas, na
Vie de feu monsieur de Espinosa (1677),
esclarece que Baruch era versado
no hebreu, no italiano, no espanhol,
no alemão, no flamengo
e no português. Johann
Kohler, por sua vez, apresenta
Baruch de Espinosa “(...)
como descendente de honrados
judeus portugueses, os quais
viviam com certa largueza, habitando
uma linda casa, onde tinha o
seu comércio, no Burewall,
perto da velha Sinagoga portuguesa”.
O filósofo freqüentou
a Escola da sinagoga de Amsterdã,
cuja língua oficial era
o português, se bem que
o espanhol era também
usado. A influência das
obras de literatura espanhola
revela-se na Ética (onde
Espinosa dá uma velada
referência a Góngora)
e no inventário de sua
biblioteca (entre os 161 livros
inventariados, encontraram-se
16 em espanhol e nenhum em português,
o que confirma o caráter
exclusivamente familiar e religioso
desta língua). Quanto
as obras constantes do inventário, é digna
de menção a do
judeu português Aehuda
Abravanell (Leão Hebreu), Diálogos
de Amor (em espanhol). No
entanto, a língua portuguesa
era oficial na sinagoga de Amsterdã.
Testemunho esclarecedor acerca
da importância que tinha
o português na comunidade
judaica de Amsterdã, é fornecido
por Mendes dos Remédios: “ (...)
a língua portuguesa perdurou
durante largo período,
não só como a língua
usada pelos literatos e homens
cultos, mas ainda no seio das
famílias como língua
própria e habitual. Nos
livros, como nos seus cartões
não importa que convite
de festa ou de cerimônia,
nas inscrições
epigráficas dos seus monumentos
tumular, a língua que
empregavam era, de fato, a portuguesa”.
A respeito do mesmo ponto, indica
Joaquim de Carvalho: “Nas
lápides tumulares do cemitério
de Ouderkerk, nas participações
de casamento, nas resoluções
e avisos da comunidade, nos sermões,
nas numerosas apologias do judaísmo
e nos escritos destinados a fortalecer
a fé dos emigrados empregava-se
comumente a língua portuguesa,
e foi em português, que
não castelhano, que em1656,
Espinhosa foi posto no harém pelos
senhores de Mahamad, nessa sentença
que não se lê sem
um estremecimento de horror”.
Espinosa foi excomungado da Sinagoga
de Amsterdã, por oposição às
suas idéias – notadamente
o pressuposto de que mesmo os
ensinamentos provenientes da
revelação deveriam
sofrer o crivo da razão – e
o fez de uma forma que se tornou
paradigmático por sua
violência, onde se diz
coisas desse tipo: “Que
o Senhor nunca mais o perdoe
ou aceite; que a ira e o desfavor
do Senhor, de agora em diante,
recaiam sobre este homem. Carreguem-no
com todas as maldições
escritas no Livro do Senhor e
apaguem seu nome de sob o firmamento;
que o Senhor o afaste de todas
as tribos de Israel e o marque
para o mal. Oprima-o com todas
as maldições do
firmamento contidas no livro
da Lei, e que todos vós
que obedeceis ao Senhor vosso
Deus sejais salvos nesse dia.
Por meio desse documento ficais,
portanto, todos avisados de que
ninguém poderá manter
conversação com
ele pela palavra oral, ter comunicação
com ele por escrito; de que ninguém
poderá lhe prestar nenhum
serviço, habitar sob o
mesmo teto que ele, aproximar-se
dele a uma distância de
quatro cúbicos e de que
ninguém poderá ler
qualquer papel ditado por ele
ou escrito por sua mão”.
Expulso da comunidade, Espinosa
viveu uns tempos do comércio
herdado de seu pai e, logo depois,
do aprendizado de uma atividade
artesã: o polimento de
lentes. Em 1660, transfere-se
de Amsterdã para uma pequena
localidade perto de Leiden e,
em 1663, para as proximidades
de Haia. Ao longo deste decênio,
alcançara nomeada em toda
a Europa protestante. Recebe
visitas ilustres, entre estas,
o próprio Leibniz. (Ver
também (A) Ética,
de SPINOZA).
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