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Dicionário das Obras
Básicas da
Cultura Ocidental
Antonio
Paim
Índice: a - b - c - d - e - f - g - h - i - j - k - l - m - n - o - p - q - r - s - t - u - v - x - w - z
BRUNO, Giordano
Nasceu em Nápoles,
Itália, em 1548,
ingressando muito jovem,
aos 17 anos, na Ordem
dos Dominicanos. Ordenou-se
sacerdote em 1572 e,
logo adiante, em 1575,
recebeu o grau de doutor
em teologia. No ano
seguinte, abandonou
tudo e fugiu, peregrinando
por diversos países
da Europa. Cerca de
três lustros
depois, regressou à Itália,
sendo preso pela Inquisição
e submetido a processo
que se arrastou por
muitos anos. Finalmente,
em 1600, foi queimado
vivo. Semelhante desfecho
veio a ser considerado
como marco destacado
da ruptura da Igreja
Católica com
a Época Moderna,
prevalecendo a corrente
que a considerava,
em bloco, maculada
pela Reforma Protestante,
posição
que permaneceu praticamente
inalterada ao longo
dos quatro séculos
seguintes. Somente
no último século
XX, com o Concílio
Vaticano II, procura
reconciliar-se com
a nova realidade, movimento
que, por sua vez, levou
a muitos equívocos
a exemplo da adesão
ao marxismo por expressivos
segmentos da hierarquia,
como seria o caso da
Ordem dos Jesuítas.
No que se refere a
Giordano Bruno, entretanto,
parece estabelecido
que a condenação
explicar-se-ia, muito
mais, por suas inclinações
mágicas que
por sua adesão à teoria
heliocêntrica,
destacado ponto de
partida da ciência
moderna. Quando a Igreja
Católica, nas últimas
décadas do século
XIX, decidiu estabelecer
a doutrina tomista
como filosofia oficial,
logo o chamado neotomismo buscou
reconciliar-se com
a ciência moderna,
porquanto tornou-se
patente o anacronismo
de vinculá-la à Reforma
Protestante. O próprio
Vaticano passou a dispor
de uma Academia de
Ciências, culminando
com o reconhecimento
do equívoco
representado pela condenação
de Galileu. A questão
Giordano Bruno seria
diferente.
Durante o seu exílio
europeu, Giordano Bruno
ministrou cursos e
escreveu livros, em
latim e italiano, entendendo-se
que o mais importante,
do ponto de vista de
expressão de
suas idéias,
seria Do infinito
(do) universo e (do)
mundo (1584).
Acerca desse título
há controvérsia,
achando alguns que
não caberia
vírgula depois
de “do infinito”.
Nessa hipótese,
o título seria Do
infinito universo e
dos mundos. Bruno
supunha a existência
de um universo infinito,
composto de grupos
de estrelas cada um
dispondo do próprio
Sol. A par disto, haveria
vida em todo o universo.
Este seria uma espécie
de corpo vivo.
Basicamente, Bruno
era adepto do hermetismo,
que se difundiu amplamente
na Itália Renascentista.
Ao mesmo tempo, contudo,
associou a doutrina à teoria
heliocêntrica
de Copérnico.
Os escritos atribuídos
a Hermes Trimegisto
(três vezes grande)
chegaram à Academia
Florentina(1) com
a indicação
de que seriam originários
do Egito, da época
de Moisés, tendo
sido inspirados na
divindade egípcia
Thot, Deus do cálculo
e do aprendizado, conselheiro
de outros Deuses egípcios.
Como mais tarde, no
século XVII,
veio a ser refutada
tal origem remota,
perdeu-se de vista
a sua significação
no contexto histórico
da Renascença.
Sua doutrina, denominada
de hermetismo,
em meio a ensinamentos
mágicos e iniciáticos
afirmava a crença
na concepção
quantitativa do universo
e encorajava o uso
da matemática
para mostrar relacionamentos
e demonstrar verdades
essenciais. Se esses
princípios já eram
conhecidos através
do neoplatonismo, a
descoberta de sua antigüidade
incendiou a imaginação
de muitos humanistas
do Renascimento, entre
estes Marsílio
Ficino.(1) Serviam
também para
nutrir a suspeita de
que Platão freqüentara
os sábios do
Egito.
A revalorização
do hermetismo explica,
em parte, que se haja
admitido o estabelecimento
de uma ponte entre
a fé religiosa
e a racionalidade da
ciência. Assim,
naquele momento, os
procedimentos quantitativos
não se achavam
em contraposição às
crenças estabelecidas,
vindo demonstrar, ao
contrário, que
estas eram mais antigas
do que se acreditava.
Hermes chegou a ser
considerado, por conter
seus escritos referências
ao “Filho de
Deus e da Palavra”,
como o mais importante
de todos os videntes
e profetas da Antigüidade
que previram o advento
do cristianismo.
A propósito
de Bruno, afirma-se
na História
da Ciência da
Universidade de Cambridge: “Até onde
se pode verificar,
não há qualquer
menção
específica da
defesa de Copérnico
por Bruno como razão
para a sua condenação.
No entanto, como é evidente,
quaisquer pontos de
vista que ele tenha
apoiado em seus polêmicos
escritos seriam suspeitos,
não menos pelos
dominicanos, a cuja
ordem Bruno pertencera; é interessante
notar o fato de ter
sido um frade dominicano
quem lançou
o ataque contra Galileu
por apoiar o copernicanismo,
catorze anos depois.
Isso se deu quando
se travou a primeira
grande batalha entre
a ciência e a
religião, e
foi o cientista Galileu,
e não o mago
Bruno, a primeira vítima
da ciência. Se
Bruno deve ser lembrado, é por
ter sido o responsável
por fazer a Igreja
Católica voltar-se
contra a maior das
hipóteses formuladas
pela nova revolução
científica,
e conseguiu fazer isso
sem que, pessoalmente,
desse qualquer contribuição à ciência”.
(Tradução
brasileira, Jorge Zahar
Ed., 1987, vol. III,
p. 72). (Ver também GALILEU,
Galilei).
(1) As
Academias apareceram
a partir do século
XV, pelo desejo
de círculos
intelectuais de
emancipar-se da
tutela das universidades
medievais. Em certo
momento, receosas
de perseguição
da Igreja Católica,
assumiram caráter
conspiratório.
No século
XVI, na Itália,
chamaram-se Academia
dos Incógnitos;
dos Secretos: dos
Corajosos; dos
Confiantes etc.
(1) Marsílio
Ficino (1433-1499),
padre, traduziu
e comentou Platão
e os neoplatônicos,
atividade que exerceu
muita influência
em toda a Europa,
sobretudo no século
XV, quando se buscava
uma alternativa
para Aristóteles
e muito impressionara
a hipótese
platônica
de que a natureza
estaria escrita
em linguagem matemática.
Pertenceu à Academia
de Florença.
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