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Galeria Grandes Personalidades
08/2008
Max Weber e
o essencial
da atividade política
Max
Weber (1864/1920) nasceu no
seio de uma família
de industriais no Oeste
da Alemanha. Seu pai
era advogado e político
conhecido, representante
de uma das facções
liberais no Parlamento.
Weber pretendia seguir
a carreira do pai e
doutorou-se em direito
na Universidade de
Berlim, 1889, aos 25
anos. Para o exercício
da docência livre,
na mesma Universidade,
elaborou uma tese sobre
o direito agrário
na Roma Antiga. Nos
anos seguintes realizou
uma ampla pesquisa
sobre o trabalho rural
nas províncias
alemãs a Leste
do Elba e também
sobre bolsas de mercadorias.
Em 1894, tornou-se
professor catedrático
de economia na Universidade
de Friburgo, transferindo-se
em 1896 para a de Heidelberg.
De saúde muito precária, desde 1897, Weber reduziu, substancialmente,
a atividade acadêmica, ocupando-se exclusivamente da investigação
dos temas de seu interesse. A partir de 1903, tornou-se diretor do Arquivo de
Ciência Social e Bem-Estar Social, renovando por esse meio os contatos
com a Universidade. Em 1904 aceitou convite para visitar os Estados Unidos. Nesse
mesmo ano publicou ensaios sobre metodologia da pesquisa sociológica e
políticas agrárias no Leste da Alemanha, bem como o livro que estaria
destinado a dar-lhe grande nomeada – A ética protestante e o
espírito do capitalismo. Nos anos seguintes, prosseguiu sem interrupção
o seu trabalho. Durante a Primeira Guerra, serviu como diretor de hospitais do
Exército em Heidelberg. Em 1918, foi consultor da Comissão Alemã do
Armistício, em Versalhes, e de uma comissão incumbida de redigir
a Constituição de Weimar. Faleceu em junho de 1920, vitimado por
uma pneumonia, aos 56 anos.
A parte fundamental da obra de Weber foi publicada após a sua morte, graças
ao empenho pessoal da esposa, Mariane Weber, que também escreveu a sua
biografia. As traduções não abrangem o conjunto. Com o título
de Economia e Sociedade, publicaram-se grande parte de seus estudos
sociológicos, achando-se essa obra traduzida ao inglês, ao francês
e ao espanhol. Dentre os outros estudos, há traduções de A ética
protestante e o espírito do capitalismo; Ensaios sobre a metodologia das
ciências sociais; A religião da China; A religião da Índia;
O judaísmo antigo e História Econômica Geral.
Em português, estão publicados A ética protestante; Ciência
e Política como vocações e uma coletânea de ensaios
(Ensaios de sociologia).
São inestimáveis as contribuições de Weber para a
cultura ocidental, cumprindo destacar a concepção de uma metodologia
que permitiu a introdução de procedimentos científicos na
sociologia; a identificação dos valores predominantes em ciclos
históricos decisivos, bem como as condições de sua mudança,
evidenciando, deste modo, o papel essencial dos valores na evolução
do curso histórico; a constituição de uma atitude compreensiva
no estudo da religião, em contraposição aos períodos
anteriores quando não se entrevia essa possibilidade, mas apenas a alternância
entre a exaltação do sentimento religioso e a crítica demolidora
da religião; e, finalmente, para destacar apenas o que há de mais
relevante, as indicações que nos legou acerca da ética
de responsabilidade, isto é, a defesa de um comportamento moral que
incorpore as conquistas da meditação moderna, sobretudo as teses
kantianas, sem insistir na hipótese do homem universal e tendo-o como
situado num tempo histórico e num território limitados.
Ao mesmo tempo em que devotou sua vida ao pensamento e à cultura, Weber
integrou-se plenamente à problemática de seu país, dando-se
conta de que o nacionalismo exacerbado conduziria à deblaque do Estado
liberal de direito. Lutou denodadamente em defesa dos valores do liberalismo
e, na medida em que via estreitarem-se os horizontes, imaginou abandonar a terra
natal e exilar-se ali onde os ventos fossem mais favoráveis ao seu ideário.
Contudo, nunca teve coragem de empreender esse passo. Lutou com empenho em prol
da manutenção da paz mas, quando veio a Primeira Guerra, compreendeu
que não dispunha de base moral para ignorar o conflito e apresentou-se
ao serviço militar. Finda a conflagração, repudiou o comportamento
daqueles que achavam ser correta a punição aos alemães,
obrigando-os a pagar pela reconstrução dos outros países.
Em Versalhes, procurou advertir quanto ao caráter suicida de tal política,
que só servia para perpetuar a cisão na Europa, como de fato veio
a acontecer. Deu o melhor de si mesmo em prol do sucesso da República
Weimar, de que presenciou apenas os primeiros passos, embora nunca tivesse escondido
suas convicções monarquistas. Sua morte coincide com a eleição
para a primeira legislatura (junho de 1920).
Pouco antes de falecer, em 1919, Max Weber pronunciou uma conferência sobre
a atividade política, que seria publicada com o título de A
política como vocação. O texto passou à história
como um documento importante acerca do papel do partido político e do
processo de sua constituição. Ao fazê-lo, Weber estabelece
a distinção fundamental entre essas agremiações antes
e depois do processo de democratização do sufrágio. Assim,
no século XIX, eram simples blocos parlamentares, isto é, formavam-se
no Parlamento em torno de notáveis, carecendo de importância os
eleitores. Escreve: “Na época não existiam partidos organizados
regionalmente, que encontrassem base em agrupamentos permanentes no interior
do país. Não existia outra coesão política senão
a criada pelos parlamentares, apesar de que as pessoas de importância local
desempenhavam papel marcante na escolha dos candidatos”. Para compreender
os partidos políticos de seu tempo – época da Primeira Guerra
Mundial – era imprescindível constatar que resultavam da fusão
entre os antigos blocos parlamentares e os comitês locais formados por
imposição do sufrágio universal e da ampliação
do universo de eleitores. E embora tais agremiações tenham desde
então continuado a desenvolver-se, tornando-se estruturas muito organizadas,
dispondo de amplas assessorias, núcleos programáticos que os distinguem
uns dos outros, publicações e variados instrumentos de formação
de quadros, Weber deu uma indicação muito precisa sobre a característica
distintiva do sistema representativo amadurecido, na forma como se consolidou
nas principais nações do Ocidente. Na formulação
de Weber, trata-se de democracia plebiscitária. Vale dizer, periodicamente,
o partido que se encontra no poder é obrigado a submeter-se ao referendo
popular.
No mesmo texto, Weber avança na formulação do que passa
então a denominar de ética de responsabilidade, distinguindo-a
da “ética de convicção”, ou “ética
dos fins absolutos”, segundo a qual os fins justificam os meios, consigna
que viria a ser encampada pelos marxistas. A ética de responsabilidade
pretende fazer renascer a tradição kantiana, no que diz respeito à eliminação
da dependência da moral à religião, reelaborando-a para abandonar
os vínculos que porventura tivesse estabelecido com a suposição
de uma sociedade racional.
Os princípios da ética de responsabilidade poderiam ser enunciados
como segue:
1º) A vida humana comporta muitas esferas que escapam à moralidade
em seu sentido próprio, nada resultando em favor da moral o empenho de
estender o seu campo de ação, havendo concomitantemente esferas
em que se dá um conflito claro entre a moral e os outros valores. Existe
notoriamente uma tensão entre moral e política e também
com as religiões que obrigam seus seguidores a menosprezar valores consagrados
socialmente. Estão neste caso os sectários que se recusam ao serviço
militar, em revide ao que a sociedade lhes cassa os direitos políticos.
2º) É necessário uma atitude compreensiva e tolerante em relação
aos valores morais últimos em que o outro faça repousar suas convicções.
Salvo a ética totalitária – que no fundo acaba por se transformar
numa proposta cínica porquanto em nome dos fins que alardeia, sentem-se
os seus partidários a cavalheiro para comportar-se de modo idêntico àqueles
que condenam, de que é exemplo expressivo a condenação da
ditadura de Batista, admitindo-se até a sua derrubada violenta, para acabar
melancolicamente justificando a ditadura de Fidel Castro –, salvo esse
tipo de comportamento, que a rigor nada tem a ver com a moralidade, sendo de
todo incompatível com a ética de responsabilidade, nos demais eventos
parte do pressuposto de que as avaliações últimas do indivíduo
nunca podem ser refutadas. É o que Weber denomina de conflito insolúvel
das avaliações.
O razoável é aceitá-las e compreendê-las, se queremos
ter direito a idêntica prerrogativa.
3º) Não devemos nos valer de circunstâncias que nos colocam
numa posição de superioridade para impor nossas convicções.
No Ensaio sobre neutralidade axiológica, Weber toma a cátedra
como exemplo
4º) Devemos responder pelas conseqüências previsíveis
de nossos atos. A esse propósito escreve Weber: “Quando as conseqüências
de um ato praticado por pura convicção se revelam desagradáveis,
o partidário de tal ética não atribuirá responsabilidade
ao agente, mas ao mundo, à tolice dos homens ou à vontade de Deus,
que assim criou o homem. O partidário da ética de responsabilidade,
ao contrário, contará com as fraquezas comuns do homem (pois como
dizia muito procedentemente Fichte,(1) não
temos o direito de pressupor a bondade e a perfeição do homem)
e entenderá que não pode lançar a ombros alheios as conseqüências
previsíveis de sua própria ação. Dirá, portanto: “Essas
conseqüências são imputáveis à minha própria
ação”.
5º) Finalmente, a ética de responsabilidade afirma que os meios devem
ser adequados aos fins; que não há fins altruísticos que
justifiquem o recurso a meios que não possam ser compatíveis com
aqueles objetivos. Assim, não se pode, em nome da exaltação
da pessoa humana, a exemplo do que ocorreu nos países vítimas do
totalitarismo, submetê-la a procedimentos que a aviltam. Os meios aviltantes é que
definem o cerne da ética totalitária, ou melhor, sob todas as circunstâncias
são os meios que definem os fins. .
Publicaram-se diversos estudos sobre a obra de Weber, entre estes Sociologia
de Max Weber, de Julien Freund (trad. brasileira, Forense, 1970) e Max
Weber – um perfil intelectual, de Reinhard Bendix (trad. brasileira,
Ed. UnB, 1986).
(1) Johann
Glottlieb Fichte
(1762-1814) deu
início à elaboração
do sistema filosófico
que deveria seguir-se à crítica
kantiana. Tendo
saído sem
o nome do autor,
sua primeira versão
do sistema (elaboraria
outras, igualmente
sem sucesso), aparecida
sem o seu nome,
foi atribuída
ao próprio
Kant, que ainda
vivia.
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